Resposta ao artigo: "A estranha obsessão brasileira pelo BJCP"

on 13 de julho de 2011


Recentemente foi postado no site Brejas, um artigo (LEIA AQUI NA ÍNTEGRA) por 5 grandes nomes das microcervejarias do Brasil.  Esse artigo intitulado "A estranha obsessão brasileira pelo BJCP" minimiza o sério órgão dos EUA em favor dos cursos de sommelier e dos já sommeliers aqui formados no Brasil, que usam o Brewers Association  para julgamentos de cerveja.
Em relação a esse artigo eu fiz um comentário, o qual reproduzo abaixo.  Não tenho nada contra o BA, mas cada órgão tem o sua proposta.  O BJCP visa cervejeiros caseiros, e assim deve ser tratado como.  Diminiuir ou minimizar sua forma de atuação é ruim para todos os cervejeiros caseiros do Brasil.





Lá vem e eu aqui bater de frente com 5 grandes nomes do meio cervejeiro brasileiro.
Eu concordo com alguns poucos pontos do artigo, mas discordo em grande maioria dos argumentos, inclusive o de tentar tirar crédito e minimizar o BJCP frente aos novos programas de sommelier de cerveja aqui criados no Brasil.

Muito das coisas abordadas nesse artigo podem ser explicadas simplesmente com as informações do site. Em relação à prova, a filosofia deste órgão sempre foi o de “fazer uma prova fácil de passar, porém difícil de conseguir aumentar o seu ranking”. Sim, um certo conhecimento é necessário, e esse conhecimento se transmite através de provas escritas e degustativas.

Agora o ponto mais importante para o argumento pró-BJCP: ele é feito basicamente para cervejeiros caseiros. E por isso parte do conhecimento do jurado (e por consequente conteúdo de prova) deve ser o de processos e técnicas de produção, afim de que possa ser passadas sugestões de melhorias ao cervejeiros baseados na análise sensorial. A prova é feita em apenas 3 horas justamente para se testar a capacidade de passar as informações o mais sucintamente. Como todos sabem, em uma competição um jurado pode ter que julgar dezenas de amostras, e se não o fizer de forma ágil e concisa, a competição sofrerá com atrasos e/ou falha de feedback ao cervejeiro.

Esse último ponto merece um parágrafo só seu. Essa não-certificação do BA entre outros acontece justamente porque cervejeiros comerciais do mundo todo não precisam receber informações detalhadas de toda a análise sensorial, sugestões de modificação de receita e/ou método e elogios ao que se tem de bom na cerveja. Muitas vezes já sabem disso. Muitas vezes não mudarão a receita. A grande diferença está no preenchimento da ficha de avaliação. E isso eu posso sentir na pele como cervejeiro caseiro. O BJCP prega muito isso: “jurados devem preencher as fichas de avaliação totalmente. As vezes até mais do que as linhas ali na ficha do BJCP permitem. Linhas vazias ou pior, campos vazios, são inadmissíveis”. E é justamente o que está acontecendo aqui no Brasil. “Jurados” acabam dando nota e preenchendo 2 ou 3 palavras por campo como ridículos “bom aroma” ou “ótima presença de lúpulo” e de nada adianta ao cervejeiro caseiro ouvir isso. Além de não explicar o que tem de bom no aroma, esse tal jurado não falou 10% do que se espera dele, não deu uma única sugestão de melhoria para a cerveja em questão. É incrível a quantidade de fichas de avaliação que não tem sequer uma crítica para a cerveja e tem uma nota de 23 de 50! “Porque eu não tirei um 35 ou um 40 então?” é a pergunta que fica!

O conhecimento da prática é realmente muito importante. E por isso não-jurados certificados do BJCP podem participar de eventos, auxiliando e até julgando algumas amostras, desde que tenham o consentimento do capitão da mesa (head judge). Para se tornar um jurado com ranking maior, pontos de experiência são necessários.

O fato de não ser atualizado desde 2008 é intencional!! Isso é algo que os anti-BJCP não entendem. Como o BA e outros órgãos recebem competições com cada vez mais cervejarias, novos estilos são inseridos justamente para se “quebrar” categorias com muitas inscrições. Se a categoria “maturada em madeira” tiver 180 inscrições, eles simplesmente quebram em “maturada em carvalho” e “maturada em outras madeiras” para poder ter menos inscritos por categoria. O que não indica que estão mais atualizados nos estilos. O BJCP propõe mudanças a partir de tendências. Se notarem que existe uma tendência de estilo nas competições (ie, muitas pessoas estão competindo com esse “novo estilo”), a diretoria do BJCP se reúne e discute se isso é apenas “fogo de palha” ou se é realmente uma tendência que veio para ficar. E aí sim cria-se um novo estilo. Não se pode achar que só porque a Falke Bier fez uma cerveja de jabuticaba temos um novo estilo..

O “belo mercado” citado na verdade é o inverso: Cursos preparatórios para o BJCP são opcionais. Quem quiser e tiver dinheiro, faz. Quem não quiser, terá as mesmas informações que qualquer outro participante justamente porque toda informação É GRÁTIS E ESTÁ ONLINE. Basta acessar o site do BJCP e você poderá estudar por conta. A primeira vez que uma pessoa faz uma prova, ela paga uma taxa de inscrição de $50 dólares. Se quiser fazer uma segunda prova, paga apenas $35 dólares. E provas parciais (degustação ou parte escrita) custam apenas $15 após a primeira vez. Em contrapartida, cursos de sommelier no Brasil custam R$2500,00 ou mais, por apenas 1 semana de conteúdo, onde se eu quiser ficar dormindo na sala de aula, serei aprovado e poderei me dirigir ao público como “sommelier formado por XYZ…”, sem prova, sem avaliação..

Jurados BJCP aqui no Brasil seriam de grande valia sim, pois ao contrário dos sommeliers, que tem suas atividades sociais e de divulgação nos encontros e eventos, os jurados BJCP estariam focados apenas no evento. Para demonstrar isso eu entrei em contato com alguns jurados que julgaram amostras esse ano no concurso das Acervas, que me disseram que gostariam de poder “desfrutar do evento” ou então de que não poderia ser julgada 200 amostras de cervejas em 2 ou 3 dias por um corpo de 20 jurados. Tais jurados estão, a meu ver, estão mais focados no social e no evento do que no julgamento, que na minha opinião não é brincadeira de 2 horas por dia rabiscando algumas folhas e depois se cansando e indo beber cervejas sem defeito.

Em tempo: O BJCP passa por mudanças e para tornar mais ágil a correção de provas, um novo sistema, com uma prova online e subsequente prova degustativa (caso o participante passe nessa prova online) com 6 amostras de cerveja será aplicada, de modo a não ter limite de pessoas por prova. Essa prova degustativa apenas poderá dar o ranking “certified” para o aplicante. Caso ele queira subir de ranking, precisará aí sim da prova escrita.

Bom, tem até mais coisas a se falar, mas eu paro por aqui. Sei que as diferenças entre os pensamentos é fonte de diferentes origens cervejísticas entre os 5 autores e eu. Mas o outro lado da história tem que ser passado, muito mais para os leitores, mesmo que em um humilde comentário, pois represento aqui os cervejeiros caseiros.

Philip Zanello

  • Veja como foi a 1a. prova do BJCP no Brasil
  • O confrade Ricardo Rosa, postou no blog dele um outro relato em discordância ao artigo do Brejas.  (VEJA AQUI)

3 comentários:

Alex da Rós disse...

Excelente debate, Phil.

Na minha humilde opinião, nem BJCP, nem Sommeliers. Na verdade ambos, desde de que tenham notório reconhecimento já basta.

ps: Notório saber é diferente de amigo.

Gilberto disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Renato Todorov disse...

Não poderia concordar mais com essa resposta.

Vejo algumas pessoas que não são cervejeiros e sim apenas "cervejólogos", ou seja, não conhecem a fundo o processo de feitura da cerveja lutando contra o BJCP. Pra que? Pra facilitar o seu marketing como "sommelier certificado"? Cada um no seu quadrado por favor né....

Vejo muita gente nesse meio mais preocupada com títulos e menos preocupadas com a cerveja em sí. Estamos apenas no início da cena cervejeira no Brasil, a evolução é natural e lenta!

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